Caros amigos,
Criamos também um espaço para a apresentação de textos filosóficos que irão enriquecer e estimular o desejo de todos que não se cansam de caminhar em direção a sabedoria e em busca da "Verdade".
Para dar início à essa jornada na seara filosófica vamos trazer um pouco de Platão que descreve (República) um diálogo entre Sócrates e Céfalo sobre a Velhice e a Personalidade de quem está vivenciando esta etapa da vida.
Esperamos que todos possam refletir um pouco mais sobre a vida e sobre suas personalidades!
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... Céfalo, pai de Polemarco, também lá estava. Como não o via há muito tempo, pareceu-me bastante envelhecido. Estava sentado em uma espécie de poltrona e, porque acabava de celebrar um sacrifício doméstico, tinha ainda uma coroa na cabeça. Dispondo as cadeiras em circulo, sentamo-nos junto dele. Ao ver-nos, Céfalo saudou-nos e disse:
- Vens poucas vezes ao Pireu, Sócrates, e no entanto, dar-nos-ia muito prazer se mais vezes viesses. Pudesse eu deslocar-me facilmente, e poupar-te-ia o incômodo de vires até aqui; iria eu próprio ver-te à cidade. Se, de futuro, voltares cá mais a miúde, muito grato te ficarei, pois bem sabes que, à medida que os prazeres do corpo se esgotam, aumentam o interesse e o agrado no assistir a uma conversa inteligente. Não recuses o que te peço. Vem visitar-nos mais vezes, como a velhos amigos, e terás então a oportunidade de falar com estes jovens.
- Na verdade, Céfalo – disse eu, - agrada-me bem mais conversar com os velhos. Esses, como estão já no fim de uma carreira que, provavelmente, todos iremos percorrer, é de nossa curiosidade que tentemos averiguar junto deles se o caminho foi cômodo e fácil, ou áspero e difícil. E, já que estás agora na idade a que os poetas chamam de “o limiar da velhice”, gostaria muito de te ver falar sobre o que pensas a tal respeito. É uma idade difícil ou não?
- Dir-te-ei a sério tudo o que penso, Sócrates. Acontece muitas vezes encontrar-me com homens da minha idade, fato que justifica um antigo provérbio; quase todos restringem a conversa a lamentos e queixumes, recordam com saudade dos prazeres do amor, da comida, do vinho e de outras coisas da mesma natureza, que desfrutavam na juventude. Afligem-se como se estivessem privados aos maiores bens e pensam que eram felizes com a vida que levavam, ao passo que a que levam agora nem sequer pode ser chamada de vida. Queixam-se outros, amargamente, dos ultrajes a que a velhice os expõe, ante a gente mais nova, e persistem em atribuir a outrem todos os males, pois se ela fosse só a velhice, também eu e os demais anciãos sentiríamos os mesmos efeitos. Ora, tenho conhecido muitas pessoas de idade cujos sentimentos são bem diferentes; a este respeito, recordo até que, um dia, estando eu presente, perguntaram a Sófocles se a idade lhe permitia desfrutar ainda os prazeres do amor.
- Amigo, nem me fales nisso, - respondeu o tragediógrafo: - há já muito tempo que me libertei desse jugo feroz e imperativo.
Naquela altura, a resposta pareceu-me boa, e a idade não me fez mudar de opinião. A velhice apresentavasse-me como um estado de paz e de liberdade a respeito dos sentidos. Depois, quando a violência das paixões se modera e acalma, compreende-se perfeitamente o pensamento de Sófocles: vê-mo-nos livres de uma série incontrolável de furiosos tiranos. E, portanto, Sócrates, as lamentações dos velhos e seus problemas domésticos, há que atribuí-los, não à velhice, mas ao caráter de cada um. Se forem de costumes moderados e de gênio meigo e amável, suportarão melhor a velhice. Caso contrário, tanto a velhice como a juventude ser-lhes-ão igualmente difíceis.
Trecho extraído do clássico “A República”, de Platão.
(Postado por Evaldo Costa, psicólogo membro do LABIRINTO)
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